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Reserva de vagas escolares: afinal, pode ou não pode?


Chegou a época do ano em que muitas escolas particulares, ávidas por preencher as vagas para o ano seguinte, enviam aos pais a famosa reserva de vaga para o ano seguinte. É uma prática comum entre as escolas particulares, tendo em vista tanto a procura por vagas quanto o planejamento interno da instituição.

Mas, afinal, a prática é ou não abusiva? Para responder a essa pergunta, precisamos analisar a questão, tanto pelo Código de Defesa do Consumidor, quanto pela Lei 9.870/99, que regula a cobrança da anuidade escolar.

A citada lei, que regula a cobrança da anuidade escolar, dispõe em seu artigo 5° que os alunos já matriculados e adimplentes têm garantia renovação de matrícula para o ano seguinte. Para muitos, a questão se resolve aqui, posto que se o aluno já está matriculado e não está inadimplente, terá garantia de vaga.

Entretanto, o mesmo artigo 5°, em sua parte final, estabelece que deve ser “observado o calendário escolar da instituição, o regimento da escola ou cláusula contratual”. Ou seja, abre uma brecha para que outros considerem que a cobrança de reserva de vaga é possível.

Vamos analisar a questão, portanto, sob a luz do Código de Defesa do Consumidor. A legislação consumerista veda qualquer cláusula contratual que coloque o consumidor em excessiva desvantagem ou desequilíbrio na relação jurídica. Também considera como prática abusiva exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva.

Ainda na legislação consumerista, há de se observar os princípios que regem o Código de Defesa do Consumidor, dentre eles o princípio da transparência e da boa-fé objetiva (um dever de lealdade entre as partes).

Como resolver esse impasse, então? Temos que verificar o que poder ser efetivamente cobrado pela instituição de ensino em à remuneração pela prestação do serviço educacional, que é a anuidade escolar. Todos os valores relativos a essa prestação de serviço devem estar contemplados na anuidade escolar que, salvo disposição em contrário, deverá ser dividido em doze parcelas iguais (ou, no caso de semestralidade, em seis parcelas iguais). Entretanto, pode a instituição de ensino propor formas alternativas de pagamento, desde que os valores não ultrapassem o total anual ou semestral.

Portanto, a matrícula escolar, por exemplo, deve estar contemplada nos valores anuais (ou semestrais) estabelecidos em contrato. Um exemplo: a anuidade escolar é R$ 6.000,00. O contrato propõe que seja o valor dividido em doze parcelas iguais e mensais de R$ 500,00 (a mensalidade escolar). Neste caso, a instituição de ensino não pode cobrar, além dos R$ 6.000,00 de anuidade, um valor de matrícula, por exemplo, R$ 500,00, pois isso incluiria uma parcela, ultrapassando o valor anual estabelecido em contrato, que totalizaria R$ 6.500,00.

Poderia, no entanto, cobrar uma taxa de matrícula, no valor de R$ 500,00, e dividir o restante dos R$ 5.500,00 em doze parcelar fixas. Ou ainda propor formas alternativas de pagamento, como o adiantamento de valores no ano anterior, com desconto, ou a primeira mensalidade parcelada no ano anterior, ou ainda negociar descontos para pagamento à vista ou em menos parcelas. O que não pode ocorrer é a cobrança de valores além da anuidade (ou semestralidade) estabelecida em contrato.

E sobre a reserva de vagas? Via de regra, a cobrança não pode ser efetuada, salvo para aqueles que ainda não sejam alunos da instituição de ensino, pois essa prática violaria a lei. Entretanto, pode ocorrer de a instituição de ensino considerar como reserva de vaga o que, na verdade, pode ser uma mensalidade ou matrícula antecipada, desde que haja condições vantajosas, ou que não sejam excessivamente desvantajosas, para o aluno já matriculado na instituição.

Por exemplo: devido à demanda excessiva, uma instituição de ensino decide cobrar dos alunos já matriculados um valor denominado “reserva de vaga” para o ano seguinte. Propõe, então, que os pais que desejarem manter os filhos na instituição paguem antecipadamente a primeira mensalidade do ano seguinte (ou a matrícula, que, na verdade, é equivalente a 1/12 da anuidade), de forma parcelada e com desconto. A meu ver, essa prática não é abusiva, pois se mantém no valor da anuidade que será cobrada no ano seguinte.

Todavia, um alerta: se a instituição de ensino determinar que o aluno que efetuou a reserva de vaga, caso se desligue da instituição antes do início das aulas, perderá o valor que pagou pela “reserva de vaga”, tal cláusula será considerada abusiva, tendo em vista que coloca o consumidor em desvantagem excessiva, pois nega a restituição de valores pagos e não aproveitados de forma alguma pelo consumidor, visto que o serviço sequer se iniciou.

Porém, se a instituição de ensino estabelecer uma taxa para reserva de vagas, pura e simplesmente, e ainda cobrar uma anuidade, não estando o valor dessa reserva contemplado na anuidade contratual, caracteriza-se prática abusiva, podendo o consumidor ser restituído em dobro do valor cobrado indevidamente.

Percebe-se que tudo é uma questão de bom senso. Se a instituição de ensino preza pelos princípios estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor e segue a legislação vigente para a cobrança dos serviços educacionais prestados, encontrará alternativas para que os alunos se mantenham matriculados, sem violar direito algum. Cabem a transparência, a boa-fé objetiva e muito diálogo entre as partes, para que todos se sintam respeitados.

Imagem: Lucas Wendt (fonte: Pixabay)

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